Após ouvir algumas dúvidas de amigos e colegas, bem como, de verificar
algumas decisões administrativas (absurdas) do INSS, ao negar o pagamento do
auxílio reclusão aos familiares (dependentes) de reeducandos, resolvi tecer
estas considerações.
A princípio devo esclarecer de forma cristalina o conceito
do auxílio reclusão:
O auxílio-reclusão é um
benefício previdenciário destinado aos dependentes do segurado que estiver
impedido de prover o sustento da própria família, por motivo de cerceamento de
sua liberdade, garantindo então a mantença de seus familiares.
Vejamos que o auxílio reclusão
é um benefício previdenciário (tanto quanto auxílio doença) que é pago aos
dependentes do segurado e não a ele (reeducando/recluso/preso).
Somente é liberado aos
familiares do reeducando, se e, somente se, à época de sua prisão, contribuía
para com o INSS. Significa dizer, se quando foi preso, tinha trabalho fixo,
registrado em CTPS.
Esse benefício serve para
garantir a mantença de seus familiares (dependentes), enquanto durar a segregação
corporal (prisão).
Nesse sentido, vale dizer, caso
qualquer cidadão que tenha trabalho (com registro em carteira) cometa um
deslize em sua conduta e for preso, poderá contar com esse benefício, para que
seus dependentes não passem necessidades enquanto perdurar a reprimenda.
Esclarecida esta primeira
fase, devo fazer outro apontamento, vejamos.
Tenho observado que, o INSS
em alguns casos vêm negando o benefício de auxílio reclusão para os familiares
de reeducando que possuem renda superior a R$ 971,78 (novecentos e setenta e um reais e setenta e oito centavos), na tabela atual (Portaria 15 de 10/01/13).
Diante desta situação os
familiares (dependentes) de reeducandos, chegam a passam algumas necessidades e
privações que jamais pensariam em passar.
Vale considerar as palavras de Mozart
Victor Russomano apud Miriam Vasconcelos Fiaux Horvath:
O criminoso, recolhido à
prisão, por mais deprimente e dolorosa que seja sua posição, fica sob a
responsabilidade do Estado. Mas, seus familiares perdem o apoio econômico que o
segurado lhes dava e, muitas vezes, como se fossem os verdadeiros culpados,
sofrem a condenação injusta de gravíssimas dificuldades. (RUSSOMANO, apud,
HORVATH, Miriam Vasconcelos Fiaux. Auxílio-Reclusão. 1 ed. São Paulo:
QuartierLatin, 2005, p. 106).
De outro lado, o INSS,
justifica a negativa de pagamento do benefício auxílio reclusão levando em
consideração a renda do reeducando na data de sua prisão.
Ocorre que este modo de
pensar e agir está em completo desacordo com a própria legislação que rege o
tema, bem como, com as decisões dos Tribunais espalhados pelo Brasil afora. Explico.
Vimos
que, referido direito exige o cumprimento de um dever correlato: contribuir
para o sistema previdenciário. Dessa forma, se o trabalhador cumpriu seu dever
de contribuir para o sistema, ele e/ou seus dependentes fazem jus à citada
proteção.
Assim
sendo, as decisões administrativas adotadas pelo INSS, tomando por base o critério
da renda recebida pelo reeducando, violam os seguintes princípios
constitucionais:
-
Princípio da universalidade da cobertura e do atendimento: A
limitação imposta pela EC n.º 20 deve ser afastada, já que deixa desprotegidos
os dependentes dos segurados (reducandos/presos) que recebiam, antes da prisão,
valores acima do referido limite.
–
Violação ao princípio da personalidade da pena: O art. 5º , XLV da
Constituição Federal estabelece que nenhuma pena passará da pessoa do
condenado. No entanto, quando a EC nº 20/98 impede que os dependentes dos segurados,
que auferiam rendimentos além do limite estabelecido, tenham acesso ao auxílio-reclusão,
está estendendo os efeitos da pena para além do condenado, uma vez que não
possuem condições de receberem salário compatível com o que recebia o
reeducando.
–
Violação ao princípio da isonomia: Com
essa limitação, observo que é latente a violação ao princípio da isonomia, já
que os dependentes de segurado que auferiam rendimentos inferiores ao limite continuam
a fazer jus à proteção previdenciária, enquanto os dependentes dos segurados que
recebiam além desse limite não estão tendo mais a proteção previdenciária que
lhes seria devida.
–
Violação ao § 2º do art. 201 – garantia de um salário mínimo: O
art. 201, §2º da Constituição Federal estabelece que nenhum benefício que
substitua o salário de contribuição ou o rendimento do trabalho do segurado
terá valor mensal inferior ao salário mínimo.
E,
embora a assistência social também faça parte da seguridade social, como o faz
a previdência
social, aquele direito social é dirigido aos necessitados, independentemente de
contribuição, nos termos do art. 203 da CF, enquanto a previdência social é
dirigida aos
trabalhadores e seus dependentes e é um direito que exige a contraprestação
direta dos
segurados, nos termos do art. 201, também da CF.
–
Da não violação ao princípio do custeio prévio: O § 5º, do art. 195,
da Constituição Federal estabelece que “nenhum benefício ou serviço da
seguridade social poderá ser criado, majorado ou estendido sem a correspondente
fonte de custeio total”.
Assim
sendo, não há que se falar em violação do princípio em comento, haja vista que o
benefício, antes da EC nº 20/98, era pago a todos os dependentes dos segurados, independente
de quanto estes recebiam antes do encarceramento. Não houve redução das
contribuições após a limitação imposta, o que permite o afastamento da
restrição sem qualquer outra previsão de custeio.
Feitas estas considerações, concluo que todos os reeducandos (presos)
que, à época de sua prisão possuíam emprego e/ou contribuíam para com o INSS,
possuem direito a receber o benefício auxílio reclusão, independentemente da
observação do limite imposto pelo INSS. Vale frisar que o limite é aplicável à
renda dos familiares (dependentes) do reeducando e não do salário deste.