Antes de tecer estas
considerações, tenho a informar que o presente não tem o condão de finalizar o
assunto, mas, de conjugar a realidade dos fatos e nossa legislação penal.
O tema é espinhoso, muitas
sociedades, organizações, vaidades e interesses orbitam nesta esfera, mas não
podemos deixar de enfrentá-lo, afinal, este é o munus que sacia a sede de respostas da sociedade.
Como é de conhecimento público (ou
pelo menos assim parece) a cessão temporário de útero, na forma remunerada, mais conhecida como
"barriga de aluguel" é tida como "proibida por lei". Vários
juristas defendem esta tese. Uns com base no artigo 15 da Lei 9434/97 (a compra ou venda de tecidos, órgãos ou partes do
corpo humano é crime com a pena de reclusão de três a oito anos, e multa, de 200 a 360 dias), outros,
sustentam a aplicação do artigo 299 do Código Penal (fazer declaração falsa em
documento púbico ou particular, cuja pena de reclusão varia de um a cinco anos
e multa).
Mas, o fato é que, NÃO EXISTE UMA
LEI QUE PROÍBA ESTE TIPO DE CONDUTA. Há uma lacuna legal, regimental que limite
esta questão da Reprodução Humana Assistida.
Então, nesta seara, cumpre-me trazer
alguns esclarecimentos sobre o direito penal a que estamos vinculados.
Nossa Constituição Federal, prevê
uma série de normas que servem de base para a aplicação do Direito Penal. É na
Constituição Federal que se realiza a integração dos princípios e garantias
fundamentais das pessoas paras com todo o arcabouço jurídico, inclusive, quanto a legislação penal. O legislador, no cumprimento de sua missão precípua (fazer
leis), deve, impreterivelmente, buscar valorar e respeitar o contido no texto
Constitucional, sob pena de criar aberrações legais que serão prontamente
afastadas pelo Poder Judiciário.
Dentre os vários princípios
existentes em nossa Constituição
Federal , destaco, para estudo do presente tema, o princípio
da Legalidade.
Este princípio tem por escopo o
de delimitar a aplicação de uma lei. Melhor dizendo, a Lei somente terá o valor
devido se, e somente se, tiver sido originada de órgão competente para tal ato
(Congresso Nacional - Senado ou Câmara dos Deputados). Qualquer outro ato,
travestido de Lei, que não tenha sido originado em órgão competente, não será
tido como Lei. Nos casos de leis penais, por se tratarem de leis que diminuem ou
restringem a liberdade das pessoas, estas devem ter sua interpretação de forma
restrita, não comportando sua criação em sentido genérico.
Na seara penal, como consequência
do princípio da Legalidade temos o Princípio “nullum crimen, nulla poena sine lege”, ou seja, princípio de que
não há crime nem pena sem lei. E, desse princípio de direito penal, podemos
extrair o seguinte:
- Não
pode haver crime sem lei;
- A
lei que define crime tem de ser uma lei precisa – “nullum crimen nula poena sine lege certa”;
- Proíbe-se
a retroactividade da lei penal – “nullum
crimen nulla poena sine lege previa”;
- Proíbe-se
a interpretação extensiva das normas penais incriminadoras – “nullum crime nulla poena sine lege strica”;
- Proíbe-se
a integração de lacunas por analogia e impõe-se a retroatividade das leis
penais mais favoráveis.
Uma lei penal não deve conter tão
só a descrição de um comportamento considerado crime; deve conter, em conexão
com essa descrição, a respectiva sanção jurídico-penal.
Neste sentido, o princípio da
legalidade tem como fundamento a garantia
dos direitos individuais.
O princípio da legalidade, mesmo
no domínio do Direito Penal tem uma justificação e um fundamento de constituir
uma garantia de direitos individuais do cidadão.
Apesar do branco legal sobre o
tema, os profissionais (advogados, juízes e principalmente médicos) se apegam na Resolução 1957/10, criada e baixada pelo Conselho Federal de Medicina, que
trata da Reprodução Humana Assistida.
Nesta seara vale alertar que esta Resolução (no sentido jurídico administrativo), para o caso em tela, não serve de parâmetro de condenação, pois, esta Resolução, embora baixada pelo Conselho Federal de Medicina, nada mais é do que, a forma pela qual se
exprime a deliberação de um órgão colegiado sobre determinado assunto. Tal Resolução também não tipificou como crime a conduta, inclusive do profissional (médico), nem estipulou qualquer tipo de pena. Até porque, qualquer ato neste sentido, escaparia da finalidade da Resolução.
Assim sendo, ainda que venham
novas tentativas de elastecer outros tipos penais com o fito exclusivo de
penalizar a conduta de cessão temporária de útero, na forma remunerada, tais
tentativas não surtirão qualquer efeito jurídico penal nos casos.
Por fim e S.M.J., feitas estas
observações, no presente momento e sob minha ótica, nos casos concretos em que houver a cessão temporária de útero, na forma remunerada, tanto a
cedente quanto a cessionária, JAMAIS PODERÃO RESPONDER POR QUALQUER TIPO DE
CRIME, uma vez que, friso, não há regramento legal (em sentido estricto) que
tipifique esta conduta como delituosa e estabeleça uma pena.
Nenhum comentário:
Postar um comentário