segunda-feira, 18 de abril de 2011

Protesto de Multas de Trânsito x Protesto de Sentenças Judiciais (precatórios)

Como é de conhecimento público e notório, a Prefeitura do Município de São Paulo vai protestar, a partir de agora, os débitos de multas de trânsito, levando o nome do motorista devedor ao cadastro de inadimplentes.

Segundo a Portaria publicada no último dia 2 no Diário Oficial (PORTARIA INTERSECRETARIAL SNJ/SMT/SF Nº 4, DE 2011), a medida foi tomada devido a existência de um expressivo volume de multas de trânsito não pagas. Inicialmente serão inscritos no Cadastro Informativo Municipal (Cadin) 697.158 proprietários de veículos, relativos a quantidade de 2.879.299 multas de trânsito não pagas entre 2006 e 2009. O valor dessas multas chega a mais de R$ 445,6 milhões. O Sistema da Administração de Penalidades Aplicadas a Infrações de Trânsito (APAIT) deverá transmitir os dados do motorista, do veículo e da infração cometida ao Sistema da Dívida Ativa (SDA).

Sem dúvidas é uma oportunidade quase única da Prefeitura de São Paulo tentar buscar receber uma boa quantia em dinheiro. Contudo, poder-se-ia aplicar tal atitude em casos assemelhados, porém no sentido contrário. Explico!

Vivemos num momento em que assistimos um grande descaso e displicência – para não dizer calote – por parte dos Municípios, dos Estados e da própria União aplicados em seus próprios servidores bem como nos demais cidadãos detentores de sentenças transitadas em julgado, agora portadores de um precatório.

Há anos, milhares de servidores públicos e cidadãos vêm tentando, através do judiciário, receber aquilo que já tinha sido prescrito na Lei, ratificado e determinado em sentença judicial irrecorrível. Contudo, são premiados com um tal de precatório que, na prática, não resolve.

Considerando que as sentenças judiciais irrecorríveis, mesmo em sua fase de execução não tornam públicos seus atos, assim como a aplicação de uma multa de trânsito, qual seria a reação da administração dos Municípios ou dos Estados ou da União, ao verem protestadas e expostas - suas milhares de sentenças judiciais não cumpridas (pagas)!?!?!!!!

Que tal os credores (servidores e empregados públicos bem como cidadãos) dos Municípios, dos Estados e até mesmo da União, possuidores apenas e tão somente dos (famigerados) precatórios (que tanto se debate sua prorrogação e sua forma de pagamento) adotarem tal prática e protestarem tais entes públicos?!?!?!!! Qual seria a reação de seus administradores?????!?!
Não sei, mas digo que é possível !!! Como fazer?!?!?!?!!!.... Fácil a resposta.

Com base na Lei 9.492/1997 é plenamente possível o protesto de Sentenças Judiciais, vejamos o que diz o artigo 1º da referida Lei:

Art. 1º Protesto é o ato formal e solene pelo qual se prova a inadimplência e o descumprimento de obrigação originada em títulos e outros documentos de dívida.

Veja-se que o texto da Lei alcançou mais do que uma simples conceituação de protesto, ampliou profundamente seu objeto. Com a inserção do termo final “ ... documentos de dívida”, no elenco dos documentos protestáveis possibilitou não apenas aqueles corriqueiros como os cambiais, como os extra judiciais (contratos) e ainda os judiciais, desde que, claro, representem dívida em dinheiro.

Para tanto, tomo a liberdade e defino documentos de dívida como sendo públicos ou particulares, devendo ser todo escrito indicando, corporificando ou representando uma dívida de alguém para com outrem de uma quantia em dinheiro.

O eminente Dr. Carlos Henrique Abrão, Juiz de Direito em São Paulo e notável Doutor em Direito Comercial, destaca que “refletidamente, portanto, quaisquer títulos ou documentos que alicerçam obrigações líquidas, certas, exigíveis fazem parte dos indicativos instrumentalizados ao protesto, cujo exame primeiro de suas condições caberá ao Tabelião, formalizando o ato, ou recusando sua feitura”. (Do Protesto - BRÃO, Carlos Henrique - 2 ed. Vet E ampli. - São Paulo: Liv. E Ed. Universitária de Direito, 2002, pág. 28).

Já o eminente jurista Theophilo de Azeredo Santos, assim define documentos de dívida como sendo “todos aqueles em que há, inequivocamente, a indicação de relação de débito e crédito entre instituições financeiras, sociedades comerciais, industriais, agrícolas ou de serviços e, também, entidades civis e seus clientes (compradores ou usuários) e, ainda, entre pessoas físicas. Assim, a Lei n° 9.492/97 deixou margem para que outros documentos que vierem a ser criados pelos usos ou costumes (v.g.: faturas de cartão de crédito, contratos de “factoning”) ou por leis posteriores, sejam agasalhados pelo citado art. 1°”. (Boletim Informativo do Instituto de Estudos de Protesto de Títulos do Brasil - Seção Rio de Janeiro, n°8, Ano 1, Dezembro de 2002).

Com tais conceitos restou clara a possibilidade de protesto de sentenças judiciais. Sobre o tema, existem inúmeros julgados confirmando a tese defendida, vejamos:
* TJRS – Apelação Cível 70011623337 – 19ª Câmara Cível – Rel. Des. Mário José Gomes Pereira – J. 13.09.2005
* TJRO – Apelação Cível 100.005.2005.009277-0 – 2ª Câmara Cível – Rel. Des. Roosevelt Queiroz Costa – J. 20.06.2007
* TJPR - Agravo de Instrumento n° 14190-9/2003 – 1ª Câmara Cível – Rel. Des. Troiano Netto
* REsp 750805 / RS

As sentenças poderão advir de juízos cíveis, criminais, trabalhistas ou arbitrais, desde que indiquem um valor a ser pago e quem deve pagá-lo.

Além das considerações destacadas, a sentença judicial condenatória de valor determinado e transitada em julgado, poderá ser objeto de protesto, gerando o efeito de publicidade específica, não alcançado pela execução, uma vez que o executado protestado, terá seu nome inserto no banco de dados de inadimplência disponíveis do mercado, tais como Serasa, SCPC, SPC Brasil, Equifax (Sindicato do Comércio e Indústria), entre outros.

Esta medida torna-se deveras eficaz, vez que é usual a utilização, pelo executado (no caso Municípios, Estados e União), de todos os meios disponíveis para procrastinação do feito, e neste diapasão, o protesto de títulos funciona como eficaz ferramenta na exigência do cumprimento da obrigação, auxiliando o credor que tem o processo de execução judicial ao seu dispor, embora nele não logre eficácia num lapso temporal razoável.

Além disso, é necessário que a sentença preencha os requisitos de liquidez, certeza e exigibilidade. Ou seja, não pode ser protestada sentença de condenação genérica ainda sujeita a liquidação. Contudo, se a determinação do valor da condenação depender apenas de cálculo aritmético, o credor poderá instruir o pedido com a memória discriminada e atualizada do cálculo, na forma do artigo 604 do Código de Processo Civil.

Assim, para o protesto é imprescindível a apresentação de certidão ou cópia autenticada da sentença judicial e de comprovação do trânsito em julgado, bem como eventual memória de cálculo.

Dito isto, com base no artigo 12 da Lei 9492/97, o protesto será registrado dentro de três dias úteis contados da protocolização do título ou documento de dívida. Esgotado o tríduo legal, o protesto será lavrado e registrado, tendo como corolário o fornecimento de sua certidão às entidades representativas da indústria e do comércio ou àquelas vinculadas à proteção do crédito, conforme dispõe os artigos 20 e 29 da referida Lei. Tudo isso feito sob o manto da segurança jurídica da fé pública de um Notário.

Assim, ao encaminhar a sentença judicial, transitada em julgado, para protesto, contra o ente público, o servidor credor (estatutário ou celetista) bem como os cidadãos estarão agindo nos rigores da Lei e no seu exercício regular de seus direitos, ficando aí mais uma ferramenta à disposição dos credores de precatórios.

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